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Segurança alimentar e subsídio compensatório


Gazeta Mercantil - 15 dez 2008 - 07:36 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:07

Alimento e energia tendem a concorrer por recursos econômicos e naturais. O uso da energia e a produção de alimentos causam impactos ambientais, que demandam empenho para produzir energia mais limpa, que então compete com a produção de alimentos. Nos últimos 40 anos, o petróleo e os alimentos ficaram mais baratos. Porém, o recente aumento dos preços do petróleo, minérios e alimentos foi interrompido pela crise financeira que partiu da bolha do mercado imobiliário dos EUA e se espalhou por outros países.

O comportamento dos preços é compatível com o padrão de consumo de energia e alimentos. Em comparação com os países desenvolvidos, os emergentes e em desenvolvimento usam de 50% a 100% mais energia por unidade de PIB (Produto Interno Bruto) e despendem 2 a 3 vezes mais com alimentação. Como esses países deverão crescer três vezes mais rapidamente que as economias avançadas, a competição entre energia e alimento vai se manter muito forte.

Quanto ao impacto ambiental, os maiores responsáveis pela emissão de CO2 são os países desenvolvidos, com larga liderança dos Estados Unidos. No Brasil, a matriz energética tem 46% de fontes renováveis. O etanol representa 35% do total. O Programa de Biodiesel tem a soja como a matéria-prima preferida. A atual capacidade de produção permitiu elevar a mistura obrigatória para 3% no diesel.

Em vários países a produção subsidiada de biocombustíveis e a obrigatoriedade do consumo são associadas à escassez de alimentos. No Brasil, o aumento da produtividade agrícola e industrial fez dissipar parte das preocupações. A pobreza parece ser a razão da insegurança alimentar, pois a oferta de alimentos excede largamente as necessidades da população.

O Cepea, da Esalq/USP, avaliou a viabilidade do etanol e do biodiesel no Sudeste do Brasil, levando em conta as previsões de preços entre 2008 e 2018. A dificuldade são as barreiras dos EUA: sem tarifa, o preço do etanol aumentaria 25% a 30%. Com a barreira, a produção do etanol, mesmo no Brasil, fica em desvantagem em relação a grãos e carnes. O biodiesel perde para uso comestível dos óleos vegetais, cuja demanda cresce.

No atual cenário, a médio e longo prazos, tanto o etanol como o biodiesel precisarão de subsídio. Se o Brasil compensar produtores via crédito fiscal, no caso do etanol, os consumidores aceitariam pagar pelo subsídio, pois seu preço ficaria abaixo do valor da gasolina; no caso do biodiesel, a produção subsidiada pode elevar os preços ao consumidor. A necessidade de investimentos seria de R$ 60 bilhões em 10 anos com retorno de 5,3% a 10,8% com taxa de câmbio entre R$ 1,55 a R$ 2,10 por dólar e se o governo decidir apoiar a produção; se as perdas da produção recaírem sobre os produtores, a taxa de retorno pode variar de -6,3% a 3,4%. A produção de energia limpa ficaria sob risco.

Três recomendações podem ser destacadas a partir dessas conclusões: a) os países desenvolvidos precisam atender a demanda por energia limpa; b) os países desenvolvidos precisam reduzir as barreiras comerciais para viabilizar a energia limpa; c) o mundo em geral precisa aceitar uma taxa de crescimento econômico menor para reduzir a pressão sobre os recursos naturais, dando tempo para o desenvolvimento de novas tecnologias. Se essas recomendações não forem consideradas, quando a atual recessão for superada, outra crise se formará, caracterizada por alta inflação e fome. Quanto à poluição, seguirá a terrível tendência já vista nos dias atuais.

Geraldo Barros - Coordenador científico do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, e professor titular da USP.
Colaboraram Lucilio Alves e Mauro Osaki