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Pinhão-manso

Empresa norte-americana desenvolve jatropha 2.0


BiodieselBR.com - 08 jan 2014 - 12:53 - Última atualização em: 29 nov -1 - 20:53
SGB Pinhao_080114
Encravada na malha urbana de um subúrbio do sul da Califórnia encontra-se uma estufa, sem nenhum traço em especial, cujos 4 mil metros quadrados de área estão tomados de arbustos frondosos. São arbustos impróprios para alimentação e resistentes à seca, e suas sementes contêm algo valioso: um óleo de alta qualidade que pode ser refinado como óleo diesel ou querosene de aviação com baixa emissão de carbono. O arbusto é a jatropha, conhecida no Brasil pelo nome de pinhão-manso.

A mera existência das plantas ali já é uma façanha.

Aclamado seis anos atrás como a matéria-prima que iria revolucionar a produção de biocombustíveis, o pinhão-manso atraiu milhões de dólares em investimentos. Ao mesmo tempo em que uma recessão se instalava, porém, os agricultores que apostaram suas fichas na novidade descobriram que a baixa quantidade de sementes obtida na safra não permitia uma rentabilidade razoável. E o pinhão-manso caiu em descrédito.

Não na SGB. Esta startup sediada em San Diego, proprietária da estufa citada, insistiu na ideia e, graças a avanços no campo da genética molecular e na tecnologia de sequenciamento de DNA, conseguiu, em poucos anos, domesticar a cultura – um processo que no passado levava décadas.

Segundo os proprietários da empresa, a variedade híbrida que está sendo plantada na estufa pode produzir óleo em volumes competitivos com um petróleo ao preço de US$ 99 o barril. Atualmente, a cotação do barril de petróleo está na faixa dos US$ 100.

Os funcionários da SGB batizaram a nova cultivar de jatropha 2.0.

A empresa tem contratos assinados para plantar 100 mil hectares no Brasil, Índia e outros países, onde espera chegar um dia a produzir 260 milhões de litros de combustível por ano. Isso atraiu o interesse de gigantes do setor energético, empresas de aviação e outras multinacionais que buscavam alternativas para os combustíveis fósseis. Para elas o pinhão-manso serve como uma espécie de garantia – ou plano B – para a eventualidade de uma guinada nos preços do petróleo, além de oferecer um caminho para que se adequem a leis que exigem o uso de combustíveis com baixo teor de carbono.

“É um dos poucos biocombustíveis que, acredito, tem potencial para suprir uma grande parcela do combustível utilizado hoje na aviação”, diz Jim Rekoske, vice-presidente de energias renováveis e produtos químicos da Honeywell, que visitou os plantios de pinhão-manso da empresa na América Central.

Rekoske e outros analistas do setor de biocombustíveis afirmam que o maior desafio para a SGB será replicar em escala comercial o mesmo rendimento obtido nas estufas.

“Como esta cultura tem um passado meio tumultuoso, em última análise conseguir convencer os agricultores a plantá-la vai ser o principal obstáculo”, diz Michael Cox, analista da Piper Jaffray.

Na estufa, os frutos da tecnologia desenvolvida pela SGB podem ser vistos a olho nu. Segundo Robert Schmidt, especialista em genética do milho e cientista-chefe da empresa, um pé de pinhão-manso comum costuma dar cachos com seis a oito frutos contendo sementes. Num exemplar de pinhão-manso híbrido, Schmidt encontrou um cacho do tamanho de uma toranja em que contou 37 frutos. “Temos casos na Guatemala onde vemos 60 frutos num cacho”, afirma.

O sucesso alcançado pela SGB, aumentando em até 900% o rendimento de sementes da planta, persuadiu o consórcio JetBio – que, entre outros, tem a participação da Airbus, da British Petroleum e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) – a assinar um contrato para o plantio de 30 mil hectares de pinhão-manso no Brasil. O objetivo do consórcio é desenvolver fontes de biocombustível para o setor de aviação, de olho nas leis que estabelecem limites para as emissões de carbono na aviação na União Europeia, Austrália e outros países. 

“A demanda é enorme. Hoje não há empresa aérea que não quisesse estar voando abastecida com biocombustível”, afirma por e-mail Rafael Davidsohn Abud, sócio-gestor do consórcio.

No entanto, os lucros com o plantio podem vir a parecer ninharia em face do potencial filão genético que a SGB começa a descobrir, identificando características que, por exemplo, tornam certas variedades da planta resistentes a condições extremas de calor ou frio.

“Se você descobrisse como criar tolerância ao calor no milho ou na soja, quanto valeria essa característica com a aceleração das mudanças climáticas?”, pergunta Arama Kukutai, diretor administrativo da Finistere Ventures, firma de capital de risco de San Diego que investiu na SGB.

Por ora, o plano da SGB é licenciar a tecnologia para indústrias do setor energético. Mas a empresa está registrando patentes de seu processo de hibridização, criando uma plataforma tecnológica que pode ser empregada para descobrir características genéticas em outras culturas agrícolas.

Em novembro, por exemplo, a SGB assinou um contrato com a Yulex Corporation para usar sua tecnologia de melhoramento molecular e aumentar o rendimento do guaiúle, uma planta silvestre que fornece um substituto para a borracha derivada de petróleo.

Para cientistas da empresa, a tecnologia também poderia ser usada para domesticar árvores frutíferas e hortaliças silvestres. Eles creem que a tecnologia tem potencial para desencadear uma nova revolução verde num mundo que, em 2050, precisará plantar 70% mais alimentos do que atualmente, na previsão das Nações Unidas, uma vez que a produtividade agrícola vem desacelerando.

As sementes da jatropha 2.0 foram plantadas no outono de 2008. Na manhã de 15 de setembro daquele ano, uma segunda-feira, Kirk Haney, CEO da SGB, foi até a sala de estar de sua casa em San Diego para preparar o que viria a ser um divisor de águas na história da start-up, que então contava apenas um ano de existência. Na sexta, a SGB combinava os últimos detalhes de um financiamento no valor de redondos US$ 200 milhões junto a investidores europeus.

“Liguei na CNBC e o Lehman Brothers tinha acabado de falir. E o índice Dow Jones afundando”, conta empreendedor tecnológico Haney, 42 anos, com seu jeitão sossegado e cara de surfista californiano.

A SGB pretendia usar o financiamento para estabelecer plantios de grandes extensões ao redor do mundo. Mas dois dias depois da queda do Lehman os investidores voltaram atrás, forçando Haney e sua equipe de geneticistas, recrutados na Universidade da Califórnia, a traçar uma nova estratégia.

Cientista-chefe da SGB, o dr. Schmidt já havia chegado à conclusão de que o pinhão-manso apresentava uma diversidade genética pequena. Era um grande entrave para o plano, já que seria difícil, se não impossível, aumentar o rendimento de sementes se todas as mudas fossem basicamente clones uma da outra.

A maior parte dos exemplares de pinhão-manso disponíveis descende de plantas cultivadas em Cabo Verde, arquipélago a oeste da costa africana. Há 300 anos Cabo Verde tornou-se o epicentro do cultivo de pinhão-manso, e uma única variedade da planta, então utilizada e apreciada como cerca-viva em criações de gado, foi exportada para regiões tropicais de todo o globo.

Pesquisando a literatura científica disponível, Schmidt deparou-se com uma referência a um obscuro trabalho realizado 30 anos antes pelo botânico Bijan Dehgan. 

O dr. Dehgan havia devotado a carreira ao estudo do pinhão-manso. Rodou o mundo coletando e catalogando as 175 espécies do arbusto, levantando a hipótese de que a planta se originara na América Central.

Fiando-se na tese do dr. Dehgan de que a Guatemala era o Éden do pinhão-manso, Schmidt viajou até a América Central e começou a analisar a composição genética das plantas da região. “Foi absolutamente espetacular a quantidade de variação genética que coletamos do centro de origem”, conta.

Essa descoberta coincidiu com uma brusca queda no custo da tecnologia de sequenciamento de DNA, o que permitiu aos cientistas da SGB identificar rapidamente as plantas mais produtivas e geneticamente diversas para em seguida cruzá-las. Também permitiu que determinassem mutações e características individuais mais rentáveis, como resistência ao calor e ao frio.

O custo para mapear geneticamente uma única linhagem de pinhão-manso, buscando todas as suas mutações valiosas, é de US$ 350, e em 2014 deve cair para meros US$ 50.

O preço cinco anos atrás? US$ 150 mil, de acordo com Eric Mathur, tecnólogo-chefe da SGB. A máquina responsável pelo mapeamento custou US$ 250 mil e hoje se encontra no laboratório da SGB num pátio de estacionamento no subúrbio de San Diego.

Chama-se sequenciador semicondutor, tem mais ou menos o tamanho de um forno micro-ondas pequeno e pode mapear 10 a 15 linhagens de uma só vez. O aparelho compara automaticamente essas sequências com um genoma de referência do pinhão-manso, que a SGB gastou US$ 250 mil para criar, de forma a identificar variações genéticas que possam indicar características desejáveis.

“Três anos atrás era simplesmente impossível fazer isso sem gastar rios de dinheiro”, diz Mathur.

Tradicionalmente, para domesticar uma planta silvestre os cientistas cruzam duas linhagens promissoras e depois torcem pelo melhor resultado possível, aguardando o florescimento para ver se o híbrido se mostra viável. Tal processo pode levar anos, quando não décadas.

A tecnologia da SGB permite que os cientistas identifiquem híbridos potencialmente produtivos em escala molecular, no laboratório, antes de partir para o cruzamento das plantas.

“Isso costumava ser um processo de descoberta que durava dez anos”, diz Mathur. “Agora está mais para um processo de dez meses.”

Segundo o cientista, a parte mais árdua do trabalho biológico molecular está feita, o que dá à SGB uma vantagem de cinco anos sobre qualquer gigante agrícola que venha a tentar reproduzir o seu sucesso.

“Não importa quanto dinheiro você tenha”, afirma o cientista, “não dá para fazer as células se dividirem mais rápido”.

Tradução BiodieselBR.com