PUBLICIDADE
CREMER2024 CREMER2024
Biodiesel

Artigo: A solução do biodiesel


André Luís Alves, jornalista em Cuiabá (MT), especializado em meio ambiente. Contato: andre@atitudev - 29 nov 1999 - 22:00 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:20

O Desenvolvimento Sustentável é uma premissa transversal do atual governo federal e que encontrou no biodiesel uma quase tradução do conceito. Isso porque as vantagens são ambientais, econômicas e sociais, ao se privilegiar a diversidade de culturas e poder beneficiar a agricultura familiar. Já abraçaram a causa, os ministérios do Meio Ambiente, do Desenvolvimento Agrário e o da Ciência e Tecnologia, além da Câmara dos Deputados, que lançou mês pasado o 1º Caderno de Altos Estudos Biodiesel e Inclusão Social.

Daqui a dois meses, o Brasil entrará pra um restrito grupo de produtores de biodiesel e para o ano que vem já é certa a mistura de 2% (também conhecido como B2) de biodiesel ao diesel derivado de petróleo, usado em motores de veículos, podendo também ser empregado na geração de energia elétrica para comunidades isoladas.

Entre as inúmeras vantagens ambientais está o fato de reduzir em 78% as emissões de dióxido de carbono (CO2), por ser renovável, além da diversidade de culturas permitidas. No campo social, a expectativa é que muitos agricultores familiares e pequenos agricultores passem a produzir matéria-prima para a fabricação do biodiesel, que pode ser mamona, babaçu, soja, dendê, girassol... O Ministério do Desenvolvimento Agrário tem cerca de 100 milhões de reais para financiar lavouras do Programa do Biodiesel, cuja meta é cobrir 150 mil hectares, beneficiando 30 mil famílias ainda em 2004. Para 2005 as metas são ainda mais otimistas. Para antender aos 2% de mistura no diesel do petróleo, 150 mil empregos diretos e indiretos serão gerados. E as vantagens tendem a aumentar já que estima-se que em 2009 o percentual de mistura seja de 5%.

No campo econômico, sendo o biodiesel um substituto para o petrodiesel, produzido a partir de fontes renováveis, como óleos vegetais, gorduras animais e até óleos de cozinha, será reduzido a importação brasileira dos 6 bilhões de litros de diesel, podendo chegar a zero quando a mistura chegar aos 20%. Isso sem falar que os empregos que serão gerados fará movimentar a economia brasileira, podendo até mesmo diminuir o desenfreado êxodo rural, que vem inchando as periferias das grandes cidades nas últimas décadas. A aposta é tão certa que uma empresa de transporte intraestadual já tem um ônibus modelo que adota o biodiesel, além do exemplo de Varginha, em Minas Gerais, cuja frota de ônibus do município já opera com o combustível limpo.

Em meio a todos esses argumentos a favor e vantagens há que se fazer o exercício do olhar crítico e se perguntar se não há riscos à introdução desse novo conceito de combustível. Quem se lembra do Proálcool? Quanto de Mata Atlântica foi desmatado em nome da independência ao petróleo? Do boom do início da década de 80 temos mais uma iniciativa do uso do álcool, mais especificamente em motores Totalflex, automóveis que podem utilizar tanto o álcool quanto a gasolina, mas a rejeição é grande. O governo tem que inventar alternativas para manter um setor que ele mesmo criou, adicionando porcentagens cada vez maiores de álcool na gasolina. Na região de Ribeirão Preto, com solo extremamente fértil, 98% da produção agrícola é cana-de-açúcar, voltado para o álcool combustível. Ou seja, toda a diversidade foi trocada por monocultura que beneficia poucos, muito poucos, fazendeiros. Isto sem falar que nesta época do ano em que se concentram as queimadas da cana aumentando significativamente os casos de problemas respiratórios, sobretudo em crianças e idosos. Além de não gerar os empregos prometidos, e viver às custas de subsídios federais e empréstimos do BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, também é apontado como fonte de trabalho escravo.

Assim como a mamona parece ser a saída em regiões semi-áridas, Mato Grosso, por meio do Programa de Biocombustíveis de Mato Grosso, que conta com a parceria da Fapemat - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso e empresas como a Ecomat e a Real Norte, está apostando todas suas fichas no biodiesel a partir da soja. O argumento é que se a soja rende menos que outros produtos vegetais, por outro lado o custo de produção também é menor e na relação custo-benefício, seria vantagem para o estado. Em outros termos, seria mais um argumento para se continuar a devastadora expansão da soja sobre a Amazônia, agora em nome de uma causa nobre e ecológica. Será que compensa, sabendo todos os impactos negativos que a soja traz ao meio ambiente e à economia? A resposta é não. Voltando à mamona, há denúncias de que na região de Cáceres, no Pantanal, estariam sendo empregados agrotóxicos proibidos (devido sua alta toxidade) em lavouras de mamonas para produção de biodiesel.

A preocupação também é da sociedade civil organizada. O Instituto Vitae Civilis, o Idec - Institudo Brasileiro de Defesa do Consumidor e o Instituto Akatu pelo Consumo Sustentável e outras 40 entidades pedem esclarecimentos sobre o biodiesel. Entre os poréns levantados está o fato de o biodiesel se degradar muito rápido, podendo causar problemas para motores estacionários, como os utilizados em hospitais. Também não há garantias de que o rendimento de motores com porcentagem maiores que 5% de biodiesel. Outro fator grave é que estudos americanos apontaram que o uso do biodiesel lá aumentou a emissão de óxidos de nitrogêncio, principal componente do "smog" das grandes cidades e indutor de bronquite e asma. Existem dúvidas se estão sendo realizados testes para quantificação das vantagens e desvantagens ambientais, bem como riscos à saúde e no que se refere a composição do preço, uma vez que o custo de produção de biodiesel ainda é incrivelmente alto.

Por tudo isso, e outros fatores não mencionados neste artigo, é necessário que a introdução dessa modalidade de combustível seja amplamente discutida e não transformada em uma panacéia de sustentabilidade.