PUBLICIDADE
CREMER2024 CREMER2024
Leilao

Informativo: 2010 em diante


BiodieselBR.com - 02 jan 2014 - 11:33 - Última atualização em: 16 mai 2014 - 13:15

Era para ser um arranjo provisório, mas até o momento os leilões de biodiesel vem se mantendo firmes e fortes como centro do sistema de comercialização de biodiesel no Brasil. Do começo de 2010 até o final de 2012, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) organizou 12 leilões por meio dos quais foi adquirido um total pouco maior a 7,8 bilhões de litros de biodiesel -  volume destinado a garantir o abastecimento da demanda criada pela mistura obrigatória de 5% de biodiesel no diesel mineral comercializado no País. Com isso, a indústria movimentou mais de R$ 17,6 bilhões no período mencionado.

O sistema de leilões de biodiesel foi uma sacada do governo federal para estimular o empresariado a se aventurar num setor que simplesmente não existia antes do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB). O plano era que, ao acenar com contratos milionários de compras, os empresários sentissem mais confiança para colocar seu próprio dinheiro na construção de usinas. Ao que tudo indica, a estratégia foi muito bem sucedida e o Brasil encerrou 2012 com bem mais capacidade instalada do que precisaria para atender a demanda.

Centralizar toda a comercialização num lugar só também resolveu um dos problemas mais espinhosos relacionados à arquitetura do PNPB: o da fiscalização do programa. Uma vez que o biodiesel é bem mais caro do que o combustível fóssil que substitui, o governo federal tinha receio de que distribuidores pouco honestos resolvessem engordar o faturamento deixando de fazer a mistura. Os leilões praticamente liquidam essa questão ao obrigar as distribuidoras a comprarem o produto dentro de um sistema chancelado pela ANP, o que torna fácil conferir se todo mundo está comparando os volumes corretos de biodiesel determinados pelas regras do PNPB.

Na prática, quem opera o sistema é a Petrobras. A estatal opera como ponte comprando o biodiesel vendido pelas usinas e repassando-o para as distribuidoras. O sistema já passou por vários redesenhos para tentar corrigir falhas diagnosticadas ao longo dos primeiros anos do programa do biodiesel.

Mecânica antiga

No início de 2010, o sistema estava funcionando como um processo de duas etapas. Na primeira delas, a ANP definia um valor de máximo de referência para o litro de biodiesel e o volume de biodiesel necessário para atender a demanda de um trimestre de consumo, que era dividindo em itens. As usinas, então, disputavam esses itens pelo esquema de leilão inverso – no qual ganha quem oferecer o valor menor – até o limite de 80% de sua capacidade autorizada. Como parte dos incentivos às usinas com Selo Combustível Social, 80% do volume comercializado nessas disputas era reservado exclusivamente para empresas detentoras do documento, os outros 20% eram disputados de forma aberta.
 
Na segunda etapa, os volumes vendidos pelas usinas eram novamente divididos e, então, revendidos pela Petrobras às distribuidoras de acordo com a média histórica de vendas de óleo diesel, mais 10% – para acomodar o crescimento. A disputa nessa etapa acontecia de forma direta, ou seja, levava quem pagava mais.

Retorno ao digital

O ano de 2010 também marcou a volta da disputa pela modalidade virtual, por meio da plataforma ComprasNet, usada pelo governo federal para realizar licitações de forma digital. Essa modalidade havia sido banida em 2007, depois que um certame excessivamente disputado deixou o setor no vermelho. A mudança pegou o setor de surpresa e desagradou muitos empresários, o que levou a União Brasileira do Biodiesel (Ubrabio) a enviar uma carta para a Comissão Executiva Interministerial do Biodiesel (CEIB) reclamando da alteração repentina. Mas o medo dos empresários não se confirmou e o 17º Leilão, o primeiro do ano, foi encerrado com um deságio médio de somente 2,75% em relação ao preço de referência.

O 18º Leilão também introduziu uma novidade importante no ordenamento do setor. Depois de encerrado o trimestre de vigência de cada disputa, a ANP, por determinação do Ministério de Minas e Energia (MME), passaria a ser obrigada a divulgar publicamente os dados de entrega de biodiesel apurados pelas empresas. A ideia era dar mais transparência ao setor e permitir acompanhar quem estava entregando menos biodiesel do que deveria. A primeira publicação foi em dezembro de 2010 depois de um atraso considerável por parte da agência.

O retorno à plataforma virtual trouxe uma nova preocupação para o segmento: o uso de robôs, pequenos programas desenvolvidos para acompanhar qualquer disputa realizada por meio do ComprasNet e dar lances de forma automatizada. Alguns consideram que o uso desse recurso é uma das explicações para o deságio dilatado registrados na 18ª, 19ª e 21ª disputas. Embora não sejam propriamente ilegais, sua utilização vem sendo desencorajada e diversas medidas foram tomadas pelos administradores do sistema no sentido de impedir seu uso ou reduzir a vantagem de quem os usa.

Mudanças aceleradas

O primeiro leilão de 2011, o de número 21, trouxe mais uma novidade importante para o setor. A partir dele, seriam definidos dois preços de referência – um para os itens com mais de 10 milhões de litros e um segundo, um pouco mais alto, para os itens abaixo desse limite. A ideia era compensar um tanto da vantagem que as usinas de maior porte acabavam levando pelo simples fato de haver menos empresas aptas a disputar os itens de maior volume.

Esse pregão também esteve entre os mais tumultuados da história do setor. Bem na véspera, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) cassou o Selo Combustível Social da ADM. A empresa não perdeu tempo e contra-atacou rapidamente ao obter um mandado de segurança que permitia sua participação no lote exclusivo, dando início a uma queda de braço com a equipe jurídica do Ministério. No final das contas, o Supremo Tribunal de Justiça deu ganho de causa ao MDA, o que obrigou a ADM a abrir mão dos 25 milhões de litros que havia vendido durante a disputa. A medida obrigou a ANP a fazer malabarismos para conseguir realocar todo esse biodiesel para outras usinas – a Agência chegou a reabrir o pregão duas semanas depois de encerrá-lo. Na confusão, o pregoeiro acabou ignorando parte das regras mais básicas do edital da própria ANP e atribuiu à BioPetro itens que superavam o limite de 80% da capacidade autorizada da usina.

Já no 22º Leilão, para reduzir a inadimplência, a ANP passou a punir com um trimestre de suspensão a usina que entregasse menos de 80% do volume arrematado – antes o limite era de 60%. Também foram deixadas mais claras as regras válidas para situações de empate entre duas usinas durante a disputa de um item e sobre o destino do biodiesel vendido por usinas desclassificadas. Além disso, passou a ser obrigatória a divulgação dos resultados do releilão de biodiesel, tornando possível saber que a operação produzia superávits milionários que acabam sendo embolsados pela Petrobras.

Esse certame pode ser considerado um ponto importante de inflexão na história do biodiesel no Brasil. À exceção de uns poucos momentos em que o mercado foi mais conservador, a maioria das disputas transpareceu a alta competitividade de um setor cuja capacidade produtiva se encontrava muito acima do consumo efetivo de biodiesel. O Leilão 22 reverteu essa tendência ao fechar com um deságio médio de apenas de 4,91% e estreou o que parece ter se tornado o roteiro geral de todos os leilões que se seguiriam: disputa fraca durante os lotes exclusivos para usinas com Selo Social, nos quais os preços fechavam praticamente colados no valor de referência da ANP, e uma competição ferrenha durante os lotes abertos, nos quais o deságio superava os dois dígitos.

Esse também foi o pregão mais longo da história do programa, tendo demorado exatas duas semanas para ser encerrado. Um problema relacionado à documentação da Comanche acabou causando o atraso, enquanto a ANP decidia o que fazer com os 7,5 milhões de litros arrematados pela usina. Como a segunda colocada no item vencido pela Comanche não poderia assumi-lo sem estourar o limite de 80% de capacidade, a agência teve que rearranjar um total de cinco itens para acomodar a mudança.

FAL

Por incrível que pareça, todas as mudanças anteriores foram só um aperitivo para o que estava para vir no 23º Leilão de Biodiesel da ANP. Para começar, a disputa deixou de ser nacional e passou a ser realizada por meio de lotes regionais, cada um deles com seus próprios preços máximos de referência.  A divisão de mercado entre usinas com e sem Selo Social também foi mantida. Além disso, o MME instituiu o chamado Fator de Ajuste Logístico (FAL), um valor relativo ao transporte entre o estado de origem e o destino do biodiesel que as usinas deveriam deduzir de suas ofertas. O objetivo dessas modificações era estimular uma maior isonomia entre os produtores instalados em diversas regiões para descentralizar um pouco a oferta que, tradicionalmente, estava concentrada no eixo Sul-Centro Oeste.

A medida não agradou a todos e a Ubrabio chegou a pedir, sem sucesso, a impugnação do edital do leilão para que o mercado tivesse mais tempo para se familiarizar com as mudanças.

Depois de praticamente reinventar o sistema de leilões, o último leilão do ano de 2011 - o 24º - foi marcado pela estabilidade de regras. O maior destaque foi o vazamento involuntário das planilhas usadas pela equipe da ANP na definição da tabela do FAL e dos preços de referência do biodiesel. A descoberta foi feita pela equipe BiodieselBR, que encontrou as planilhas anexadas no portal ComprasNet. A análise desse documento desconcertou o setor ao revelar que os preços eram definidos somente com base nas cotações da soja e da mamona – esta última, uma matéria-prima que não é usada comercialmente e, praticamente, não reflete os custos da indústria.

Mais uma vez o resultado do leilão demorou a sair por complicações causadas durante a disputa. A homologação final foi divulgada somente no dia 27 de dezembro.

Enfim, um novo leilão

Depois de dois anos de mudanças sucessivas e vários problemas, estava mais do que claro que o setor precisava de um modelo completamente novo de leilões. Já no começo de 2012 ouviam-se rumores de que o MME estava preparando uma alteração muito mais radical que qualquer outra já realizada –o que realmente aconteceu.

Em maio, o MME apresentou um modelo completamente novo de comercialização para o setor. Nele, não se sabe antecipadamente quanto de biodiesel será ofertado ou comprado: as usinas escolhem quanto querem vender e dão preço ao seu produto de acordo com uma referência regional da ANP. As distribuidoras também participam mais do processo, escolhendo de quais usinas querem comprar e o volume que desejam adquirir. Por fim, a Petrobras compra o produto das usinas escolhidas e depois vende para as respectivas distribuidoras, acrescentando um ágio fixado previamente. Tudo isso utilizando uma ferramenta própria baseada na plataforma de compra da Petrobras, a Petronect, abandonando de vez o ComprasNet.

O sistema seria divido em quatro etapas. Na primeira, as usinas interessadas em participar do leilão apresentam sua documentação e a ANP faz a avaliação desses dados previamente ao certame. Isso garante que apenas as usinas aptas a participar façam seus lances, diferente do que acontecia no modelo anterior.

Depois de habilitadas, as usinas fazem suas ofertas em duas rodadas. Cada uma pode fazer até três ofertas com volume e preço distintos, sendo que o volume total não pode exceder a capacidade produtiva da usina para o período de entrega e o valor não deve ser superior ao preço máximo de referência definido pela ANP para a região onde está localizada a usina. Após essa rodada, todos os lances são abertos para as participantes do leilão e é possível saber os preços e os volumes ofertados pelos concorrentes. Abre-se a segunda rodada de propostas e as usinas apresentam três novas ofertas com volumes mantidos e preços menores ou iguais à rodada anterior.

Na segunda etapa, as ofertas das usinas com Selo Combustível Social são apresentadas às distribuidoras, que poderão escolher de quem comprar e o volume a ser adquirido. As ofertas não arrematadas, total ou parcialmente, passam para a etapa 3, na qual aguardarão os lances junto as ofertas das usinas sem selo.

Em ambas as etapas, se mais de uma distribuidora estiver interessada sobre o mesmo volume de determinada usina, tem início uma disputa de preços, com valores sempre crescentes. Esse ágio oferecido fica integralmente com as usinas, ao invés de ficar com a Petrobras como no modelo anterior. Além disso, nenhuma distribuidora pode comprar das usinas sem selo mais que 25% do volume que comprou das usinas com selo na etapa 2 e na etapa 3.

A quarta etapa nada mais é que a consolidação dos dados pela ANP para a divulgação do resultado, que deve ser homologado para que os contratos entre usinas e distribuidoras sejam firmados.

Um único leilão foi realizado exatamente nesse formato, o 26º, que ocorreu com uma boa adaptação das usinas, sem contratempos significativos – a não ser na etapa de responsabilidade da ANP. A agência demorou quase três semanas para homologar os resultados da disputa, formalizados só depois que as entregas já deveriam estar acontecendo.

Pouco depois, em agosto, o MME publicou uma portaria que acrescentou duas novas fases ao processo. A partir do L27, a comercialização de biodiesel passou a ser dividida em 6 etapas: 1ª - Habilitação; 2ª - Apresentação das ofertas pelas usinas; 3ª - primeira rodada de compras pelas distribuidoras (exclusiva para usinas com Selo Combustível Social); 4ª - Reapresentação de preços pelas usinas; 5ª - segunda rodada de compras pelas distribuidoras (aberta a todas as usinas); 6ª - Consolidação do resultado final.

As novidades foram discretas e se restringiram às etapas 1 e 4. A fase de habilitação, que antes era de responsabilidade da ANP, passou a fazer parte do processo formal do leilão, aumentando o rigor no cumprimento das regras. Já na etapa 4, as usinas passaram a ter a possibilidade de reduzir os valores de seu biodiesel entre a 1ª e 2ª rodadas de compras das distribuidoras, permitindo uma correção de preços caso tenham adotado uma estratégia equivocada para o leilão.

A portaria também autorizou a ANP a decidir a periodicidade dos certames. Assim, em novembro de 2012, a agência publicou o edital do L28 no qual informava a mudança dos leilões de trimestrais para bimestrais. A novidade foi recebida sem grande surpresa pelo setor, que, no geral, avaliou a alteração como positiva ou até como indiferente. E as compras não deixaram a desejar – o leilão comercializou 496,3 milhões de litros para atender a demanda de janeiro e fevereiro de 2013, 22,5% a mais do volume que foi consumido no mesmo período de 2012.